Hermenêutica das Paixões

A hermenêutica das paixões consiste numa via fenomenológica de acesso  às nossas emoções nos contextos sociais e nas relações pessoais, no amor, na família e no trabalho.

Constitui-se no ambiente  sistêmico das relações a partir da aplicação da psicologia dos eneatipos e da teoria dos 3 amores de Cláudio Naranjo ao processo de restauração das relações parentais (Stroke/Naranjo/Hoffman).  Através da autorregulação esses diferentes sistemas vão se revelando durante o processo terapêutico, que toma como base a complexidade do modo de funcionamento do psiquismo e, do que poderíamos chamar de mecanismos básicos  geradores da experiencia emocional e cognitiva das paixões, desvelando o significado do que somos enquanto um “esquema ou estrutura” emocional próprio ao ser do ser humano.

    Onde quer que o ser pareça estar, ele não está…o ser só pode ser encontrado da maneira mais improvável, através da aceitação do não-ser e de uma jornada através do vazio.


Cláudio Naranjo

   

Um dos aspectos cruciais do desenvolvimento humana tanto quanto do trabalho terapêutico, consiste em fomentar a integração das emoções e das experiências afetivas básicas da pessoa dentro das organizações existentes de sua expressão. Aprender a utilizar nossas emoções como sinais,  a partir da autorregulação organismica, nos torna capazes de sintetizar diferentes estados contraditórios em resposta  a uma dada situação. Implica responsabilizar-se na tarefa de sintonização empática dos outros com nossos sentimentos. As emoções são o que nos mobilizam e nos informam, e, quando se integram com a razão nos fazem mais sábios do que somos quando utilizamos apenas o intelecto. É durante estes momentos de atender a, que nossa experiência produz atos fundamentais de nossa construção como seres humanos no mundo, ser-no-mundo.

A vida sana é um processo de adaptações criativas na interação com outras pessoas, com o ambiente, com as coisas e consigo mesmo. É  no afeto, que se refere a uma resposta biológica não consciente ante certa estimulação, tanto quanto no sentimento que supõe o dar-se-conta das sensações  básicas desse afeto, que a experiência consciente das emoções humanas se integram às tendências de ações que coincidem com os estados emocionais que os evocam na produção do processo autentico de ser.

A aplicação de nove aspectos existenciais revelados no Eneagrama da Personalidade, por Cláudio Naranjo, trabalha com as três categorias de fenômenos reconhecidos pela psicologia ocidental desde Franz Brentano, a saber: o pensar, o sentir e o querer. E, com ideia de que a essência fundamental do caráter possui uma natureza dupla: o aspecto motivacional em interação com uma tendência cognitiva. Uma figura revelada sob um fundo dinâmico motivacional, que na linguagem da Psicologia dos Eneatipos correspondem a uma “paixão” associada a uma “fixação”.

São motivações neuróticas que em geral estão de acordo com a visão freudiana das vicissitudes dos instintos, um bloqueio da instintividade, que acaba por prevalecer em cada pessoa. Assim, há na dinâmica dessa interrelação o domínio de um paixão e um estilo cognitivo preponderante correspondente à personalidade, agindo de tal forma, como se uma interferência da paixão sobre o instinto prolongasse a influência de uma cognição desvirtuada, que em ultima instância bloqueia o fluxo continuo na realização da experiência de autenticidade de todo ser.

Atualmente é quase um senso comum a afirmação que existe um maior ou menor grau de imaturidade na estrutura da personalidade de todos os seres humanos, mas para a psicologia esta imaturidade pode ser vivenciada como uma explícita fraqueza e inadequação do próprio ego, já que essa sensação de fraqueza surge de uma ausência de sentimentos confiáveis com relação à própria realidade e identidade como um ego, como um eu.

Cláudio Naranjo, através da Psicologia dos Eneatipos, vai nos falar em termos de ser ou sentido de ser em vez de ego ou auto-identidade para a essência da pessoa sana, e de “deficiência ôntica” ou “obscurecimento ôntico” para a essência da neurose.
 Entretanto, afirma que temos que levar em conta o sentido e a tradução da palavra ego, não o da psicanálise, já que essa iguala ego a “si mesmo”, mas o da psicologia transpessoal, ou seja, como uma obstrução interna, uma persona ou um caráter, que corresponde a soma total dos condicionamentos e das respostas adaptativas que não são verdadeiramente um si mesmo, e que não são adequadas para a vida no presente aqui-e-agora. E, alerta para um fator absolutamente fundamental: a “essência” da pessoa “como tal”.

Isso implica que a necessidade da existência do eu, afirma-se na intencionalidade do eu sou, já que necessariamente tenho a evidencia que eu sou, como também de que não sou, ou de que posso ser de outro modo, portanto, posso figurar outros eus e pensar a mim mesmo de modos diferentes.

É o sentimento da ausência dessa essência que configura o núcleo de toda a psicopatologia, fator fundamental na raiz de todas as paixões, como motivação de deficiência, que é uma sede de ser que existe lado a lado com uma vaga apreensão da perda do ser.

práxis fundamentada na compreensão e integração do traço  neurótico principal da personalidade,  uma figura no âmbito da Gestalt-terapia, que revela-se para o auto conhecimento do homem,  em sintonia com a Psicologia dos Eneatipos, constitui-se como originária de um ethos, revelado na hermenêutica fenomenologica das paixões, uma epifania do cuidar.